quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Casar com o emprego

Encontrar um emprego é (quase) como encontrar o amor.
Ahh! Encontrar o tal! Aquele emprego que pague bem, que tenha colegas e patrões fixes e cujo trabalho seja, também ele, fixe! Desde a candidatura em que prometemos trabalhar para a relação laboral da melhor forma que soubermos, passando pela entrevista em que pode haver aquele clique, aquela química especial. Apaixonamo-nos à primeira vista pelas atividades que se realizam naquele escritório e as regalias associadas ao salário fazem-nos fantasiar com o que poderá aí vir; também os patrões ficam enamorados à primeira vista com a possibilidade da nossa paixão pelo ofício nos pôr a trabalhar para lá das 8 horas diárias (ou 7 para os funcionários públicos). Depois, por entre vários candidatos, somos aceites! O nosso perfil e o primeiro encontro superaram todos os outros! Fomos escolhidos! O namoro, oficial, porque aqui não há pegas nem pegos(!), é celebrado com um comprometimento por 6 meses a termo certo. Se a coisa correr bem, segue-se o casamento a termo (obviamente) incerto; até aqui já tínhamos prometido ser fiéis ao emprego e ele fez o mesmo por nós, só que agora começa a partilha de bens, eventualmente começa-se também a planear ter filhos que podem ser estagiários adotados ou universitários recém-formados.  Prometemos exclusividade no lucro e na dívida. Seguem-se as primeiras luas-de-mel em feiras de empresas ou em turismo científico. As prendas também ficam mais valiosas, se antes um mero subsídio de refeição bastava, agora já se exigem cabazes de Natal e bónus! Nas primeiras festas de família vislumbramos, pela primeira vez, os nossos avós e bisavós que, encharcados com álcool, fazem de bobos da corte, num acontecimento que, tal como um eclipse solar, é raro e belo... e pode cegar. Mas é aqui que entendemos: fazemos parte da família!
No entanto, nem tudo são rosas... A certo momento, alguns colaboradores começam a encontrarem-se com outros empregadores... Como qualquer traição, sempre às escondidas. Ora entram mais tarde, ora saem mais cedo... "o que se passa?"... "nada"... Devem estar à procura de outro emprego que pague melhor? Mas prometeram ser fiéis, bolas! Será um emprego nearshore mais musculado? Será um emprego noutro país mais exótico e sensual? E depois... Sim... Depois dizem-nos de repente: está tudo acabado (com um pré-aviso de 1 ou 2 meses)! Não és tu, sou eu... que quero ganhar mais ou que quero ver outros colegas... Mas... eu posso mudar... posso-te dar ainda mais benefícios como sushi às quintas-feiras ou iogurtes gratuitos ou... um aumento salarial... Não entendes... sinto que já não me dás a atenção que um profissional como eu mereço... há quanto tempo não me promoves? E aquelas tarefas que, quando começámos, me punham o coração a mil? Onde estão? Agora é só reuniões, papelada e aturar clientes! Não! Não aguento mais! É melhor assim... E segue-se o divórcio no qual o empregador fica com a maioria dos bens... a separação da nova, e agora velha, família... e... adeus! Até já(?)!
E, assim, o colaborador parte para outro emprego onde, eventualmente, irá partir mais corações laborais...

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